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A vida aos 15%: como a alta nos juros afeta famílias, empresas e o ritmo da economia

09 de julho de 2025
Veja Abril

Depois de acabarem com a hiperinflação no Brasil, alguns dos principais formuladores do Plano Real, programa de estabilização da moeda que completou 31 anos na terça-feira 1º de julho, decidiram se debruçar sobre outra mazela nacional que emergiu tão logo os preços galopantes desapareceram: as exorbitantes taxas de juros de que o Brasil passou a depender dali em diante. Em 1998, ainda sob um custoso regime de câmbio fixo, os juros básicos brasileiros chegaram a bater impressionantes 40% ao ano.  

Eles seguiriam ainda por uma década acima dos dois dígitos e recorrentemente no topo dos mais altos do mundo. 

O Brasil, na verdade, nunca saiu do pódio global dos juros mais elevados, mas a inquietação em torno das causas desse fenômeno — e, sobretudo, de seus efeitos nocivos na economia — voltou ao centro dos debates. O gatilho foi o aumento recente da Selic para 15% ao ano, decidido pelo Banco Central em meio à difícil missão de seu presidente, Gabriel Galípolo: conter uma inflação persistente, alimentada por gastos públicos que seguem em disparada no governo Lula. Tendo em conta a recaída populista do presidente, na base do discurso antagonizando pobres contra ricos, a necessária correção de rumos fica cada vez mais improvável.

Resultado: a Selic não alcançava um nível tão alto desde 2006, quando Lula também estava no Planalto. Entre as quarenta maiores economias do mundo, apenas a Turquia, com uma inflação de 35% ao ano, apresenta juros reais superiores aos 9,5% ostentados hoje pelo Brasil. 

A taxa real, que desconta dos juros nominais a inflação, é a que realmente influencia a vida de empresas e pessoas, afetando crédito, consumo e decisões de investimento. 

E o cenário está longe de melhorar:  em relatório recente, o Banco Central alertou que a Selic deve permanecer nesse nível por “um período bastante prolongado”,  até que haja sinais claros de que a inflação, atualmente em torno de 5% anuais, retornará à meta de 3%.  

“O Brasil tem estruturas que exigem juros mais altos que os de outros países para conter a inflação”, afirma Fabio Kanczuk, ex-diretor de política econômica do BC e atual diretor de macroeconomia da instituição financeira ASA. Entre os fatores que explicam essa anomalia estão os elevados gastos públicos, o baixo nível de poupança e um emaranhado de subsídios e linhas de crédito oficiais que amortecem os efeitos do aperto monetário. 

É por isso que o país consegue conviver com taxas que, em qualquer outra economia, provocariam uma hecatombe.  

“Os juros já estão altos há algum tempo, mas é agora que começarão a surtir efeito”, afirma Kanczuk. 

O impacto imediato é tornar o crédito mais caro, algo que desestimula o consumo das famílias e freia os investimentos das empresas. 

Com a queda nas vendas, as companhias reduzem a produção e começam a demitir.  

Menos renda em circulação leva à diminuição da demanda, e só então os preços — a última peça desse dominó — passam a recuar. “Investir ficou caro e não se sabe como ficará a demanda, então, quem tem dinheiro está deixando guardado na renda fixa”, diz Luciano Telo, executivo-chefe de investimentos para o Brasil da UBS Global Wealth Management, gestora suíça de fortunas de famílias e empresários. Quem já tem dívida, por sua vez, vê o custo de pagá-las pesar mais, enquanto os juros aumentam.  

“Demitir é a última opção das empresas, mas, conforme o endividamento piora, elas ficam sem opção além de cortar custos, até chegar aos funcionários”, afirma Camila Abdelmalack, economista do Serasa Experian.

Os danos, de fato, começam a se espalhar pela economia, antecipando tempos mais duros à frente. 

“O varejo já vem sendo significativamente pressionado pelo aumento de custos e, apesar do mercado de trabalho aquecido, começa a sentir os efeitos nas vendas”, diz José Roberto Tadros, presidente da Confederação Nacional do Comércio. A chamada “tempestade perfeita” se completa com a fuga dos consumidores de compras a prazo. 

Um exemplo desse comportamento é o do estudante José Cristovão dos Prazeres Neto, de 24 anos, que desistiu da compra de uma moto nova depois de analisar o custo da dívida.  

“Acabei optando por uma usada, que pude pagar à vista”, diz. Com o tempo, isso significará uma unidade a menos a ser produzida — um reflexo dos juros altos sobre a indústria. 

A fabricação de equipamentos de transporte, como motocicletas, que havia crescido 10% no ano passado, recuou 1,5% em maio na comparação com abril, segundo o IBGE.  

E o fenômeno se repete em outros setores dependentes do crédito, como eletroeletrônicos, móveis e materiais de construção. “A indústria ainda tem alguma capacidade ociosa e há espaço para ampliar a produção”, afirma Mário Sérgio Telles, diretor de economia da Confederação Nacional da Indústria. “Mas, diante das expectativas de crescimento mais lento, é difícil imaginar novos anúncios  de investimentos.” 

Entre os setores que mais dependem do crédito, a construção civil — um dos maiores empregadores do país — também começa a perder fôlego. “Essa Selic só não virou uma catástrofe porque veio em um e forte demanda”, afirma Milton Bigucci Junior, sócio e diretor técnico da construtora paulista MBigucci. Para conter o endividamento, a empresa decidiu, por ora, frear os lançamentos econcentrar esforços na venda dos imóveis já prontos ou em construção. Não está sozinha.  

O anúncio de novos empreendimentos no país — o que gera os investimentos e empregos — caiu 28% no primeiro trimestre em relação ao trimestre anterior, segundo levantamento da Câmara Brasileira da Brasileira da Indústria da Construção. “O setor ainda não está demitindo, mas já contrata menos do que no ano passado”, diz o presidente da entidade, Renato Correia.

A boa notícia é que, ao menos por enquanto, ninguém prevê uma grande crise. As projeções dos economistas indicam que o país deve crescer cerca de 2% neste e no próximo ano.  

 É um ritmo modesto, mas estável, após três anos de expansão por volta de 3%. A má notícia é que o desempenho está longe de ser suficiente para corrigir as deficiências estruturais do Brasil.  

 está longe de ser suficiente para corrigir as deficiências estruturais do Brasil. No longo prazo, crescer mais exige inflação controlada e juros baixos. 

Trata-se de uma fórmula bastante conhecida, mas que o país ainda não conseguiu pôr em prática. “Não existe uma única explicação para os juros historicamente altos no Brasil”, 

diz Márcio Garcia, professor de economia da PUC-Rio e estudioso do tema desde os tempos do Plano Real. “Mas não há dúvida de que, se os governos contivessem nossos gastos públicos excessivos, a taxa poderia ser muito menor.” Em trinta anos, o país avançou em reformas importantes. Ainda assim, o trabalho está longe de ser concluído para que os brasileiros possam se ver livres dos recorrentes ciclo... 

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