JMN Contábil

Conflitos na base de cálculo para o recolhimento de ITCMD em SP

29 de julho de 2024
Consultor Jurídico

Em 21 de maio, a Fazenda de São Paulo lançou a operação “loki” [1], com a finalidade de verificar possíveis simulações de compra e venda para acobertar doações de quota de empresas sem o pagamento do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD) devido ao estado, tendo por objeto as transmissões de quotas e ações de empresas, que foram em instrumento de cessão onerosa, mas que possam representar doações disfarçadas.

A iniciativa fiscal mira os sócios/acionistas de empresas que tenham transferido ou recebido quotas sociais/ações em transação onerosa, por valores considerados ínfimos que possam justamente representar uma doação. Geralmente, tais operações são realizadas entre pessoas com algum grau de parentesco e envolve os planejamentos sucessórios com as administradoras de bens próprios, ou holdings patrimoniais, também objeto da fiscalização.

No cenário de transmissão onerosa, o Fisco recomenda aos contribuintes que acaso não exista comprovante de pagamento da venda da quota social que reconheça a operação como doação e proceda à entrega da declaração do imposto com recolhimento em atraso.

 

Além disso, é objeto da fiscalização a transmissão gratuita das quotas sociais, considerando-se como base de cálculo para o ITCMD o valor da quota social quando da integralização de capital e não quanto, de fato, o valor que representa. Neste cenário, há declaradamente uma doação da participação societária, mas que se usou base de cálculo inferior àquela determinada pelo estado. Deste modo, busca-se a tributação da doação, tendo por base o patrimônio líquido da empresa que, não raro, é bem superior ao valor das quotas propriamente dito.

Notificações

Em decorrência da operação, milhares de contribuintes já foram notificados pelo fisco paulista, conforme noticiado pelo Valor [2], a fim de que busquem a autorregularização, acaso tenha havido uma cessão onerosa de quotas sociais simulada, ou utilizado base de cálculo inferior à considerada pelo Estado.

Conforme orientação da Secretaria da Fazenda, tais notificações não configuram início de ação fiscal que, portanto, darão ensejo a algum tipo de lançamento de ofício e autuação fiscal. São tratadas pela fiscalização como uma “oportunidade” dada ao contribuinte para que se regularizem, acaso se enquadrem em alguma das hipóteses, e não sejam submetidas à cobrança de multa punitiva no valor de 100% do imposto não pago. Inclusive, o governo estadual veiculou um vídeo orientativo no YouTube e abriu um canal serviço que se destina exclusivamente à recepção de documentos relativos a contribuintes acionados na operação “loki” [3].

 

Base de cálculo

Paralelamente à questão da operação deflagrada pelo estado, paira uma discussão acerca da base de cálculo do ITCMD quando da transmissão gratuita, causa mortis ou doação¸ de quotas ou ações, se seria adotado o valor patrimonial da quota ou valor representativo do patrimônio líquido da empresa, ou seja, conjunto de ativos menos passivos da sociedade.

De acordo com a Lei Paulista do ITCMD, nº 10.705/2000, no artigo 14, parágrafo 3º, em casos de participações de capital social que não forem objeto de negociação, em bolsa de valores por exemplo, ou não tiverem sido negociadas nos últimos 180 dias, admite-se como base de cálculo o respectivo valor patrimonial.

É justamente sobre a definição do valor patrimonial que repousa a discussão acerca da base de cálculo do ITCMD, já que engloba conceitos dados além do Direito Tributário e que possam conflitar com o artigo 110, do CTN [5].

Neste passo, a Sefaz já emitiu várias respostas a consulta de contribuintes acerca do valor a ser utilizado como base de cálculo do ITCMD [6], cujo entendimento reflete o conceito de valor patrimonial como o valor corrente de mercado para as quotas sociais, conforme se extrai do trecho da RC 27.578/2023:

 

“7.2. Assim, mesmo aplicando-se o artigo 14 ao presente caso, as quotas a serem transmitidas deverão, a priori, ser avaliadas conforme seu valor de mercado. Afinal, o que pretendeu o legislador foi aproximar o máximo possível a base de cálculo do valor de mercado do bem ou direito transmitido, apenas admitindo outros critérios na dificuldade de se encontrar tal valor. Forçoso reconhecer, portanto, que o § 3º contém mera possibilidade, cuja adoção dependeria do consenso entre o Fisco e o contribuinte.”

Entretanto, a própria secretaria reconhece a dificuldade em se atribuir valor de mercado a quotas sociais, de modo que caberia ao contribuinte identificar qual o valor que mais se aproximaria da realidade mercadológica para submeter ao recolhimento de ITCMD, ficando ressalvada a prerrogativa de a fazenda questionar o valor atribuído, nos termos do artigo 11, da Lei 10.705/2000 [7].

“9. É importante ressaltar, também, a multiplicidade de variáveis envolvidas no cálculo de uma participação societária – cotação no mercado, expectativas de rentabilidade, relação custo/benefício, cenário econômico, análise setorial, entre outras. Ademais, a noção de valor patrimonial não se restringe à análise do patrimônio líquido da empresa. Como se não bastasse a infinidade de elementos necessários para se atribuir valor às participações societárias, o próprio elemento ‘valor patrimonial’ não é conceito único, se dividindo em valor patrimonial contábil e valor patrimonial real.”

 

Deste modo, em que pese a operação “loki” não tenha, a priori, o caráter fiscalizatório conforme noticiado, fatalmente levará aos contribuintes que pretendem regularizar suas transmissões a definirem qual seria o valor da base de cálculo do imposto, podendo deles discordar e instaurar procedimento administrativo para arbitramento de valor.

 

Em um primeiro momento, aceita-se como base o valor do patrimônio líquido dividido pela quantidade de quotas sociais, o que se chama de valor patrimonial contábil, contudo a Sefaz também orienta que quando o patrimônio líquido é inferior ao próprio capital social da empresa, em cenário de prejuízo acumulado, por exemplo, o contribuinte deve buscar meios de se avaliar a participação societária, ainda que inexistente.

Holdings patrimoniais

Outra questão a ser ponderada é em relação à doação das quotas das holdings patrimoniais. Comumente, os sócios de tais empresas integralizam o capital com bens imóveis, a título de conferência na empresa, pelo valor declarado no IRPF, procedendo à doação subsequente da participação societária.

Neste caso, o valor patrimonial contábil da quota ou ação seria o próprio valor do(s) imóvel(is) integralizado(s), dividido pela quantidade de quotas, para fins de determinação de ITCMD. Contudo, o Estado passou a exigir o imposto sobre a transmissão de quotas de empresas patrimoniais calculado pelo valor de mercado do patrimônio, não aceitando o custo histórico do bem, inclusive emitindo respostas a consultas nesse sentido [8].

 

Por esta razão, contribuintes passaram a buscar o Judiciário, a fim de afastar o entendimento fiscal que visou à incidência de ITCMD sobre o valor de mercado dos bens que compunham a empresa, para que ficasse adstrita ao custo histórico do imóvel integralizado na empresa e o TJ-SP decidiu favoravelmente aos contribuintes em algumas oportunidades [9], conforme se observa na ementa abaixo:

“AÇÃO ANULATÓRIA ITCMD – Base de cálculo que deve considerar o valor patrimonial contábil das quotas sociais doadas, não o valor real dos imóveis integralizados ao capital social – Inteligência do art. 14, §3º, da Lei nº 10.705/2000 – Honorários advocatícios fixados por equidade Possibilidade Aplicação do art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil – Observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade – Sentença de procedência mantida – Recursos desprovidos.”

 

Conclusão

Com base nessas discussões, fica evidente que a operação manejada pelo estado de SP ainda apresentará desdobramentos, na medida em que, com as pretensas regularizações tributárias pelos contribuintes, o Fisco poderá discordar dos valores adotados na base de cálculo do ITCMD, acarretando em procedimentos para arbitramento de valores e/ou autuações fiscais sobre tais operações.

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